Tuesday, April 03, 2007

Texto de Abertura do 4° Festival de Cinema Gay e Lésbico de Lisboa


A quarta edição do Festival de Cinema Gay e Lésbico de Lisboa vai uma vez mais acontecer, desenvolvendo e aprofundando temas já abordados nos anteriores Festivais, sob novas e variadas perspectivas.
Neste ano, o Festival rende-se ao imaginário gay, que, povoado de mitos e ícones universais, contribui para a redefiniçào de estéticas, valores e comportamentos nesta área.
Com a duração de três semanas, o Festival antecipa-se com uma série de filmes no Fórum FNAC Chiado, subordinada ao “camp”. Sinônimo de exuberância, de excesso e de brilho, o “camp” é uma das traduções possiveis daquele imaginário. No decurso deste ciclo, de uma semana, serão apresentados alguns classicos, seleccionados em função das actrizes, dos actores e das personagens que eles encarnam. Terão, assim, oportunidade de rever Marlene Dietrich, ou Elisabeth Taylor, ou ainda David Bowie, entre outros.
Um dos momentos altos da abertura deste Festival é o da homenagem a Simone de Oliveira. Figura impar da música portuguesa, que demonstrou, ao longo da sua carreira, humanidade, generosidade e coragem, Trata-se de qualidades que fazem com que Simone mereça o nosso publico elogio. Depois há ainda o outro lado, o dos vestidos, o da voz profunda e o da força como ela pisa o palco que, em conjunto com todos os outros elementos, a transformam num icone.
Outra vertente do imaginário gay é a que se relaciona com a inspiração das divas, que surgem em diversos dos filmes seleccionados neste ano. Dai a opção por uma, para imagem quer do cartaz quer de outros materiais promocionais do Festival. Muito embora, e de acordo com o espirito de liberdade que caracteriza este certame outros prefiram interpretar aquela imagem de outras formas. Um direito que lhes assiste.
Relativamente ainda ás divas, é de apontar a noite Transgender, uma vez que são numerosos os exemplos de divas transgenders. A realização desta noite, uma tradição já deste Festival, ira contudo, ter este ano uma tónica diferente, uma vez que vai ser exibido o documentário The Bandon Teena Story, que, de forma dramatica, relata a sua vida. Este documentário terá inspirado o oscarizado Boys Don’t Cry. De sublinhar a presença nesta noite, de Susan Muska e Greta Ólafsdottir, as duas realizadoras do documentario.
Este ano, o Festival apresenta três ciclos: Filmes Actuais Franceses, Derek Jarman e Jeen Noel René Clair. Do primeiro destacam-se Goutes D’ Eau Sur Pierres Brûlantes de François Ozon, vencedor do Teddy deste ano, do Festival de Berlim e Presque Rien, de Sébastian Lifshifz. No segundo, não se pode deixar de sublinhar o excelente documentário There We Are John, realizado por Keri McMullen. Finalmente, JNRC, realizador polémico, pela irreverência e originalidade, na forma como faz pornografia constitui uma referência na cinematografia deste género. A decisão de incluir este ciclo no Festival tem a ver com o assumir desta vertente e com o lugar que esta ocupa no cinema em geral.
Apesar de ser temático, o Festival esta aberto a outios tipos de filmes, que pela história, ou pelo “campness”, se possam relacionar com o imaginário gay. Exemplo desta abertura é a realização, pela primeira vez este ano, da Straight Night, no decurso da qual irá ser exibido o fiIme Hotel Splendide, realizado por Terence Gross. Esta noite é, igualmente, testemunho de um dos princípios mais caros ao Festival que dirijo, o da oposição à lógica de guetização, já que esta só pode levar a exclusão.
Tal como em anos anteriores, a colaboração e, mais do que isso, o encorajamento que a CML, o ICAM e a Cinemateca Portuguesa nos prestaram – o que espero se repita nos próximos anos – é crucial para o sucesso deste evento. De realçar ainda a aposta renovada dos Institutos Culturais Alemão, Britânico e Franco-Português, que igualmente contribuem de forma decisiva para o Festival. Não se pode deixar ainda de salientar a participação da FNAC. Gostaria também de dar as boas vindas este ano à Atalanta Filmes com quem desde já formulo votos de voltar e colaborar no futuro.
Tenho também de prestar aqui uma homenagem. quer aos amigos do Festival, todos aqueles que mantêm este projecto vivo, especialmente nos momentos mais difíceis, quer, e muito em particular, ao coordenador de equipe de tradução e respectivos voluntários.
A legendagem de filmes é uma aposta deste Festival no sentido de o tornar mais acessível para todos, possibilitada quer pala motivação, quer pelo espírito de equipa quer ainda pela capacidade de trabalho demonstrada, vezes sem conta, ao longo de largos meses.
O modelo seguido pelo Festival deste ano revela um amadurecimento do mesmo. Depois da na primeira edição, se ter optado por um Festival retrospectivo, de na segunda o experimentalismo ter sido nota dominante e de, na terceira, se ter previlegiado o cinema mainstream, a quarta edição denota um claro equilibrio entre estas três soluções.
O Festival ao longo do tempo, ganhou uma dinâmica própria conferida em larga medida pela equipa que o mantém vivo durante os doze meses do ano e que é a principal responsável pela sua existência. Esta equipa, composta por voluntários, alguns dos quais associados da ILGA-Portugal, ganhou este ano uma vida própria o que me leva a questionar e a ter de reavaliar o modelo organizativo do Festival nos próximos anos. Isto é, o desenvolvimento do Festival, a sua projecção como um dos certames de referência dentro e fora da Europa e a solidificação da conquista do espaço, que já detém, na cidade de Lisboa, abrem o caminho a um outro olhar sobre este projecto.
Um olhar que se quer solidário, dinâmico e sobretudo concentrado em abrir novos mundos a Lisboa.
Divirtam-se
Celso Júnior

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