Tuesday, April 03, 2007

Texto de Abertura do 5° Festival de Cinema Gay e Lésbico de Lisboa


É tempo, uma vez mais, para outra edição, a 5a, do Festival de Cinema Gay e Lésbico de Lisboa, oportunidade singular para novamente desenvolver e aprofundar temas já abordados em edições anteriores, bem como para lançar novos temas e novas questões, provocando renovadas inquietudes.
Com a duração de duas semanas, o Festival deste ano foi antecipado pelos três ciclos de cinema exibidos ao longo do Verão no Fórum da FNAC-Chiado. Tratou-se de uma iniciativa que, à semelhança do ano passado, contou com o apoio enérgico da FNAC, conhecendo assinalável êxito.
Neste ano, o Festival foca, sob diversos pontos de vista, por vezes até contraditórios, a temática, sem dúvida complexa e pouco consensual, da identidade dos géneros. Inúmeros autores têm, ao longo dos tempos, analisado esta questão, procurando definir o que é masculino, feminino e transgender, muitas das vezes à luz de critérios religiosos ou morais, entre outros.
Talvez mais adequado aos tempos actuais é o pensamento da autora americana Eva Figes que aponta como fenómeno originador das diferenças entre masculino e feminino a doutrinação. Ou seja, o ser humano é o que a sociedade, da qual ele faz parte, quer que ele seja. As diferenças não são inatas, mas adquiridas.
Não será, pois, natural que numa sociedade mais livre, em que os direitos individuais sejam aprofundados e enriquecidos, as identidades dos géneros esmoreçam? E que a diversidade seja criada por cada indivíduo?
Afinal, como dizia Pessoa, “o amor é que é essencial, o sexo é só um acidente".
Foi a partir destas ideias que se optou por seleccionar filmes como La Confusion des Genres, de Ilan Duran Cohen; Beau Travail de Claire Denis e que se decidiu prestar homenagem ao extraordinário universo de Pedro Almodóvar. É também por este motivo que continuamos a julgar importante incluir a temática straight neste Festival. Este ano alargámos para três as Noites Straight onde serão exibidos filmes tão diferentes entre si mas todos eles abordando temáticas que justificam a sua inclusão num Festival que pelo título se poderia julgar desajustado à sua exibição, mas onde cabem, afinal, todas as formas de estar na vida. Também as Noites Transgender são já uma tradição no nosso Festival e contam este ano com a exibição de três filmes onde o tema é tratado de forma distinta: La Différence, uma curta metragem de animação; Yo Soy Asi e The Iron Ladies são as propostas transgender deste ano, que, estou certo, serão suficientes para agradar os gostos mais diversos. Repetidas também vão ser as ‘Noites Hard’ desta vez dedicadas à retrospectiva do trabalho do realizador canadiano Bruce LaBruce, que estará connosco neste Festival. Bruce LaBruce, é um realizador conceituado que tenta com o seu trabalho conciliar a arte e a pornografia libertando-se dos preconceitos de ambas as áreas e seguindo um rumo muito próprio que vale a pena conhecer. Para além de Bruce LaBruce, o Festival orgulha-se de ter entre os seus convidados nomes como o de Vicente Molina Foix, Ángela Molina, Eusebio Poncela, Loles Léon, Baltasar Kormákur, Ilan Duran Cohen, Tsai Ming -Liang Alain Burosse, Jorge Torregrossa, Sue Malawa Bruce, Marie-Pierre Huster, entre outros realizadores e actores, a quem quero desde já agradecer.
E os agradecimentos vão também, e em primeiro lugar, para a Câmara Municipal de Lisboa que, tal como nos anos anteriores, tem apoiado, encorajado e acarinhado este Festival, quer através dos vários departamentos que connosco colaboram, quer na própria pessoa do Senhor Presidente da Câmara, Dr. João Soares. Sem eles não haveria Festival. Agradeço ainda aos institutos culturais alemão e britânico que continuam a apoiar este projecto, ao ICAM, à Cinemateca Portuguesa, à ATL e à FNAC, cujos apoios se repetiram este ano, fazendo-nos acreditar no sucesso das edições anteriores e apostar cada vez mais em sucessos futuros. E muito particularmente quero agradecer ao Instituto Cervantes e à Embaixada de Espanha pela colaboração na nossa homenagem ao cinema espanhol, e ao lnstitut Franco-Portugais pelo apoio e colaboração na selecção dos filmes do Ciclo das Sexualidades, destacando o importante contributo de Dominique Chastres. Ainda na sequência deste ciclo, não posso deixar de agradecer aos convidados presentes no debate promovido no âmbito deste acontecimento. Reservo ainda um agradecimento ao Centro de Estudos de Antropologia Social pela colaboração na organização do debate promovido em torno de alguns dos filmes exibidos. Para a equipa de tradução vai também um agradecimento especial pelo trabalho e dedicação numa área do Festival que nos é cara: a da legendagem da totalidade dos filmes exibidos, tomando-os acessíveis a todos os espectadores.
Novidade este ano é a da organização do Festival pela recém criada Associação Cultural Festival de Cinema Gay e Lésbico de Lisboa, uma associação sem fins lucrativos e apartidária, criada a pensar na organização do evento. Deve sublinhar-se, não obstante, que este certame nasceu, cresceu e adquiriu a sua maturidade no seio de uma outra associação, a lIga-Portugal, a qual ocupa um lugar ímpar no panorama das organizações GLBT portuguesas, quer pelo trabalho desenvolvido, quer pelo respeito que alcançou e que merece toda a gratidão do Festival de Cinema Gay e Lésbico de Lisboa.
Um Festival que renova e alarga os seus espectadores todos os anos, conseguindo uma cada vez maior participação, envolvimento e cumplicidade da cidade de Lisboa, que demonstra assim o seu empenho, à semelhança do passado, em trilhar novos caminhos e em descobrir novos mundos em liberdade.
Divirtam-se!
Celso Júnior

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